Pokémon Legends: Z-A busca inovação em franquia cansada

Eu realmente quis acreditar. Aquela esperança quase inocente de que a Game Freak finalmente iria nos surpreender. Lumiose City poderia ser o “renascimento” que todos esperavam, um sopro de vida depois de anos com remakes morno e bugs que mais pareciam piadas. Nos primeiros minutos, até me deixei levar. Os menus coloridos, a trilha sonora com um toque de jazz francês e as novas Mega Evoluções me deixaram animado… parecia que agora ia.

Mas logo percebi que tudo era uma ilusão. O jogo prometia um mundo aberto, mas na verdade era uma rua cheia de cercas invisíveis. A sensação de liberdade era só um truque, e o que parecia novo era apenas uma versão repaginada da mesma fórmula de sempre. O que começou como uma empolgação sutil foi aos poucos se transformando em uma decepção, quase imperceptível. A cada diálogo sem voz, a cada porta que não se abria e as batalhas repetitivas, fui percebendo que a mágica inicial estava desaparecendo. Restou apenas o esqueleto de uma ideia promissora, envolto em menus e ilusões não cumpridas. Pokémon Legends: Z-A parece errar mais por falta de esforço do que por acaso, e isso é bastante triste.

A ilusão de grandeza

O jogo começa com uma promessa de algo grandioso. A câmera se move por Lumiose, tentando passar a ideia de uma metrópole vibrante, o “coração do mundo Pokémon”, como narrado. Lumiose é linda à distância, mas fica vazia perto. Em poucos minutos, você percebe que aquele coração não bate: é só uma repetição de animações, personagens não jogáveis reciclados e portas que você não pode abrir. A cidade se revela uma maquete impressionante à distância, mas sem vida quando você chega perto.

Lembro da minha primeira caminhada pela avenida principal, empolgado com a possibilidade de um mundo novo à frente. Mas, de repente, um obstáculo aparece no meio do caminho. O jogo simplesmente decide que não é hora de ir para lá. “Não agora”, diz a voz constante do jogo.

A verdade é que Pokémon Legends Z-A não quer que você explore; ele quer que você siga um roteiro. E isso acontece com um sorriso falso, como um guia turístico que proíbe você de tirar fotos. Cada esquina parece prometer algo — um beco misterioso, uma placa cheia de histórias —, mas no fim, tudo não passa de cenário. A Game Freak chama isso de inovação, mas eu senti que era uma falta de confiança, uma insegurança em deixar o jogador descobrir o que há fora do script.

O trabalho de repetir

Em algum momento, entre a quinta missão secundária idêntica e o diálogo que parecia escrito por um estagiário em piloto automático, percebi que o jogo não queria que eu jogasse, mas que eu simplesmente preenchesse planilhas invisíveis. Cada tarefa em Legends Z-A se transformava em uma lista de verificação disfarçada de aventura: caminhe até ali, veja uma cena, vença alguém que repete as mesmas falas, ganhe um item inútil. A rotina é o verdadeiro vilão aqui.

As missões prometem algo novo, um personagem diferente, mas no final, você recebe o mesmo molde com uma nova roupagem. Não há caça de Pokémon, apenas uma repetição de protocolos. Nem mesmo o sistema de evolução disfarça esse problema. As recompensas que você recebe parecem mais uma forma de te lembrar do tempo que você passou do que um verdadeiro prêmio. O jogo te dá a impressão de que está progredindo, mas é só uma ilusão.

E há uma sensação constante de déjà-vu. O jogo parece saber que está se repetindo. Você segue Pokémon três vezes na mesma missão, enfrenta NPCs que sempre usam os mesmos Clefairy e é elogiado como se isso fosse uma grande conquista. Tudo soa automático, sem intenção, sem alma. Mesmo as tentativas de humor soam como desculpas para a falta de criatividade. É como uma piscadela de quem sabe que falhou, mas acha que o carisma pode resolver.

A história que parece briefing

Em teoria, Pokémon Legends Z-A tem uma história: você faz parte de uma equipe endividada e precisa trabalhar para os agiotas enquanto tenta salvar sua líder. Mas, na prática, a trama é só uma desculpa para transformar a exploração em um expediente. As missões são mais como tarefas corporativas, com diálogos que soam como memorandos e ordens que você não pediu para receber.

A narrativa tenta ser madura, abordando temas como dívidas e comunidade, mas tudo isso com a sutileza de uma apresentação de PowerPoint. Não há vilões, os agiotas são retratados como benfeitores e a empresa que controla a cidade é vista como uma amiga. É uma propaganda disfarçada de história, um mundo sem conflito onde até a servidão é chamada de “serviço à comunidade”.

No meio disso, o jogo ainda apresenta o Z-A Tournament, que parece um reality show interno. Você luta à noite, sobe letras do alfabeto e ganha pontos de reputação. Na teoria, isso é a base do jogo. Na prática, são apenas batalhas contra NPCs que têm dois Pokémon e frases genéricas de incentivo. O ciclo se repete: dias de tarefas banais, noites de batalhas, e tudo começa de novo.

Feito pra trailer, não pra jogar

Nos trailers, Z-A parecia que tinha finalmente entendido o que era evoluir: iluminação suave, reflexos nos prédios, câmera girando com a segurança de um blockbuster. Mas, na prática, essa beleza dura pouco. No Switch 2, os 60 frames por segundo até enganam, mas no Switch 1, o jogo tropeça nos 30, apresentando um show de pop-in — aqueles NPCs que aparecem do nada, sombras piscando e texturas carregando lentamente.

E a ausência de vozes continua sendo a piada mais antiga da franquia. Os personagens gesticulam, movem a boca, mas não sai som. É como assistir a uma peça ensaiada sem som, onde você entende o que acontece, mas sente uma vergonha alheia. O maior feito de Z-A é rodar sem travar… e isso já se tornou um elogio.

Visualmente, tudo brilha demais. As roupas têm um brilho artificial, os Pokémon parecem bonecos de vitrine e a cidade inteira tem aquele ar falso de shopping. De longe, é impressionante. De perto, é só maquiagem. Há algo triste nesse brilho. Parece o esforço de quem sabe que não tem conteúdo, então tenta distrair com luz. Mas essa distração evapora rápido.

Combate: a novidade que tenta algo diferente

O combate em tempo real de Pokémon Legends Z-A é o primeiro sinal de que a Game Freak, talvez, tenha percebido o problema que a série enfrenta há anos. Há um esforço genuíno para renovar o ritmo das batalhas, aproximando-as do que vemos no anime. Elas têm energia, impacto e um senso de urgência que a série evitava.

Na primeira vez que desviei de um golpe, senti que algo havia mudado. Finalmente, não era só escolher os mesmos golpes. O sistema combina elementos de ação e RPG tático, onde você se move e ataca, alternando habilidades em tempo real. Quando funciona, é uma delícia ver o impacto de um Surf arrastando a cena, ou coordenar um combo rápido antes do oponente reagir. É uma sensação de controle que a série nunca teve antes.

Mas o sistema ainda engasga em momentos críticos. A responsividade varia: algumas habilidades miram automaticamente, enquanto outras exigem posicionamento preciso e quebram o ritmo. É como dirigir um carro esportivo com câmbio automático; rápido, mas com travas que lembram que ainda há um script por trás.

Os chefes “Rogue Megas” mostram que a equipe quer experimentar. As arenas fechadas e os padrões de ataque transformam as batalhas em algo mais tenso. No começo, é empolgante enfrentar um Mega gigante cercando seu time, mas a repetição pesa. Os ataques seguem padrões previsíveis e o foco no treinador quebra a ilusão do duelo. Ainda assim, a base é sólida. Com ajustes, há um embrião de algo maior aqui.

Conteúdo e duração: menos é pouco

Pokémon Legends Z-A chega com cerca de 230 criaturas disponíveis, um número que parece pequeno diante dos mais de mil Pokémon que a franquia já acumulou. O DLC, já anunciado e com preço definido, promete adicionar mais 150 Pokémon, além de novas Mega Evoluções. Isso levanta um questionamento: será que esse conteúdo foi cortado do jogo principal?

A variedade de tipos existe, mas é rasa. Os mesmos Pokémon aparecem em diferentes áreas com pequenas variações. Os novos Megas, embora visualmente interessantes, vão do criativo ao bizarro. É a primeira vez em anos que a Game Freak realmente tenta algo novo, mas o resultado é desigual.

Quanto ao tempo de jogo, quem seguir a história principal deve chegar aos créditos em 20 a 25 horas. Completistas que se arriscarem nas missões secundárias podem estender isso para 35 ou 40 horas, no máximo. A duração é curta, mas o ritmo irregular faz o tempo parecer longo. E mesmo as figuras lendárias, como Mewtwo e Zygarde, aparecem sem muito contexto, quase como troféus colecionáveis.

O preço do costume

É curioso como o jogo começa leve e termina pesando no bolso. No início, você só quer capturar e explorar. Mas quando percebe, já pagou R$ 349 por isso e mais R$ 159 pelo DLC anunciado antes do lançamento. A diversão pode acabar, mas a conta permanece alta.

Esse valor poderia ser justo se Z-A fosse realmente um avanço. Se mostrasse uma Game Freak disposta a arriscar e entregar um mundo vibrante. No entanto, o que temos é um jogo que custa como um título de grande porte, mas que teve um orçamento relativamente baixo. É um projeto vendido como obra-prima, mas que parece um rascunho bem polido.

O mercado já entendeu a mensagem: Pokémon não precisa ser excelente; só precisa existir. A marca sustenta tudo. O que mais incomoda é a acomodação. A Game Freak sabe onde estão as portas certas, mas não quer abri-las. Prefere pintar o cenário, vender a entrada e chamar isso de revolução.

Pokémon Legends: Z-A não é um desastre completo, mas serve como um lembrete de um potencial enorme sendo guardado a sete chaves. Se você quiser ver para onde a série poderia ir, vale a pena. Mas se está buscando um milagre, pode acabar se contentando com algo que apenas funciona.

Prós e contras

Prós:

  • Combate em tempo real traz frescor à série.
  • Performance estável no Switch 2, sem grandes bugs.
  • Boa trilha sonora e ambientação sonora envolvente.
  • Pequenos toques narrativos mais maduros.
  • Mega Evoluções repaginadas adicionam variedade tática.
  • Base sólida para futuras inovações na série.

Contras:

  • Estrutura repetitiva e linear, com pouca liberdade real.
  • Visual datado e falta de ambição técnica.
  • Lumiose City é quase toda fachada.
  • Missões genéricas e sidequests sem impacto real.
  • Mundo vazio, com pouca exploração e quase nenhum segredo.
  • Ausência de dublagem e legendas em português.
  • DLC de R$159 parece conteúdo cortado do jogo base.
  • Relação custo-benefício preocupante, com um preço alto pela experiência.